miercuri, iunie 29, 2005

Debatedores defendem novo estatuto das microempresas (Brasil)

Os participantes da audiência pública promovida hoje pela Comissão Especial da Microempresa, que trata das modificações no Estatuto das Micro e Pequenas Empresas (Projeto de Lei Complementar 210/04), ressaltaram a importância do projeto para o setor. O projeto, apresentado pelo Poder Executivo, concede uma série de isenções tributárias para microempresários com faturamento bruto anual de R$ 36 mil, reduz encargos trabalhistas e estimula a inclusão dos empregados no regime previdenciário.
O presidente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Paulo Tarciso Okamoto, acredita que a proposta vai beneficiar 80% das microempresas, possibilitando a melhoria de vida para 12,8 milhões de pessoas.Segundo Okamoto, no Norte e Nordeste a maioria das microempresas informais fatura menos de R$ 40 mil por ano. "A proposta, com todos os limites, é a mais inovadora que conheci", destacou.

Informalidade
O diretor-secretário da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Luiz Carlos Dias, fez um apelo aos deputados para que aprovem propostas que beneficiem os microempresários e criem condições favoráveis para acabar com a informalidade. Segundo o diretor, o empresário de pequeno porte é punido pela escolha da formalidade. "Metade das microempresas declara falência em até dois anos de atividade", alertou.O presidente da Associação Comercial de Minas Gerais (ACMinas), Eduardo Prates Octaviani Bernis, apresentou um retrato da informalidade em Belo Horizonte. Segundo pesquisa da entidade, 48% dos informais trabalham com comércio; 24%, com serviços e 13%, com indústrias.Bernis comentou ainda que 57% dos entrevistados têm vontade de registrar a empresa para melhorar o retorno financeiro e crescer. Do total, 43% não querem obter o registro. Desses, 28,4% alegaram que é por causa dos altos impostos.

Modelo simplificado
Para o relator, deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), o ideal seria o País ter um modelo tributário simplificado, como o dos Estados Unidos, onde o imposto de renda das pessoas físicas e jurídicas representa 48% da carga tributária. No Brasil, o Imposto de Renda significa apenas 21% da carga tributária, enquanto os tributos sobre o consumo somam 58%.O deputado destacou ainda o crescimento da carga tributária brasileira. Ele lembrou que, em 1988, era de 28% do Produto Interno Bruto (soma das riquezas produzidas pelo País ao longo do ano). Atualmente, a carga alcança quase 40% do PIB. (fonte: Agência Câmara)

luni, iunie 27, 2005

Entidades reguladoras, corporativismo fiscal

A multiplicação desordenada de tributos associados à regulação económica, a par da multiplicação desordenada das entidades que os cobram, constitui um dos desenvolvimentos menos saudáveis do nosso sistema fiscal. A Entidade Reguladora da Saúde, criada com o propósito de assegurar a disciplina e acompanhamento dos prestadores de cuidados de saúde, mal entrada em funções vê-se já em conflito com os operadores do sector, obrigados a pagar taxas de supervisão que julgam exorbitantes.
As desventuras da Entidade Reguladora da Saúde teriam o seu quê de pitoresco fossem elas um caso isolado. Facto é que o não são. Com a liberalização progressiva dos mercados, o Estado português recuou progressivamente na sua função de produtor, recolhendo-se às funções mais neutras da regulação externa da economia. Nos últimos anos, muitas são as entidades criadas com este propósito, institutos públicos e autoridades reguladoras, mais e menos independentes, invariavelmente financiados por "taxas de supervisão" cobradas aos operadores económicos que lhe ficam sujeitos.
Porque estas taxas são geralmente concebidas pelas próprias entidades reguladoras, movidas pelo propósito elementar de angariar o máximo de receita pelo expediente mais eficaz, produz-se pouco a pouco uma fiscalidade feita de tributos avulsos, criados nalguns casos com apuro técnico, noutros casos sem ele, em todo o caso sem qualquer matriz comum nem articulação recíproca, cada entidade reguladora cuidando das próprias taxas sem que alguém cuide do efeito combinado que todas elas produzem. É assim que a ERS se financia cobrando taxas sobre o capital social e facturação anual dos estabelecimentos de saúde, o INFARMED cobrando taxas sobre o volume de negócios das farmacêuticas, a CMVM cobrando taxas assentes sobre os activos geridos pelos operadores dos valores mobiliários sujeitos à sua autoridade ou sobre as comissões por eles recebidas. A tolerância com que os nossos tribunais têm encarado estas figuras e o facto de elas se situarem numa área onde raramente chega a opinião pública constituem um estímulo poderoso ao seu alargamento: a Entidade Reguladora para a Comunicação Social, adivinha-se já, encontrará também as suas "taxas de supervisão", igualmente engenhosas com toda a certeza.
Ao lado dos grandes impostos vemos, pois, formar-se uma fiscalidade paralela, semelhante àquela com que em tempos se financiavam em tempos as juntas nacionais e as comissões reguladoras. As "taxas de coordenação económica" que ao longo do Estado Novo se infiltravam no preço do arroz, do bacalhau, da cortiça, do pão, do algodão em rama e de tantos outros bens de consumo, renascem agora como taxas "de supervisão", "de comercialização" ou "de fiscalização", diferentes na terminologia, semelhantes no funcionamento. Começa, assim, a adivinhar-se este resultado paradoxal: o recuo do Estado para as funções mais modernas da regulação, pretendendo entre outras coisas garantir maior eficiência à economia, acaba por recriar o aparelho parafiscal da economia corporativa, entravando o mercado com mil e um tributos de bagatela. E tudo isto com custos de contexto para as empresas que não são despiciendos, desde a adaptação de sistemas informáticos e de facturação à contestação judicial destas taxas em processos custosos e demorados.
Não se pode honestamente pôr em causa que a civilização tenha um preço, que a regulação seja proveitosa aos mercados e que alguém tenha que pagar por ela. Faz sentido que a paguem os operadores de cada sector económico, e que a paguem indirectamente os respectivos clientes, mas os tributos públicos que se criem para o efeito têm necessariamente que ter cabeça, tronco e membros. Cabeça, sobretudo. Os tributos cobrados para financiar a regulação dos mercados não podem constituir impostos alternativos sobre os rendimentos ou sobre o volume de negócios, devem assentar nos custos inerentes à actividade das reguladoras sem ultrapassar o que é necessário à respectiva cobertura. E os custos dessa actividade e das diferentes prestações em que ela se desdobra devem ser públicos e acessíveis aos operadores que lhes estão sujeitos, para que estes se possam defender com eficácia.
Existem muitos vícios no nosso sistema fiscal que se não podem resolver por decreto. Este, porém, é um daqueles raros casos em que o decreto pode bastar. Talvez seja chegado o tempo de pôr travão ao experimentalismo de institutos públicos e entidades reguladoras e de estabelecer um enquadramento legal para os tributos parafiscais que os alimentam, subordinando-os a regras comuns e princípios ordenadores claros, acolhendo de modo inequívoco e atempado as orientações da jurisprudência comunitária em vez de lhes tentar resistir até à última hora. Para regular a economia não é com certeza necessário desregular o sistema fiscal. (Sérgio Vasques in Público, suplemento Economia, 27 de Junho de 2005)

duminică, iunie 26, 2005

Cláusula contratual que autoriza rompimento unilateral de seguros de saúde pode ser anulada (Brasil)

Cláusulas contratuais que autorizam as seguradoras a romper, unilateralmente, contratos de seguro de saúde são passíveis de anulação. Esse entendimento levou a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a prover recurso interposto contra a decisão da Justiça do Rio Grande do Sul que havia reconhecido a legalidade da rescisão unilateral, feita pela Sul América Aetna Seguros e Previdência, de um contrato de seguro de saúde em grupo firmado com a empresa DNMS Factoring.
No recurso interposto no STJ, a DNMS alegou ser abusiva a cláusula do contrato firmado com a Sul América que permitia a rescisão do seguro de saúde sem sua concordância, mediante simples notificação prévia. A empresa argumentou que o ato da seguradora viola uma série de dispositivos legais, entre os quais a Lei nº 9.656/98, que trata dos planos e seguros privados de assistência à saúde, e o Código de Defesa do Consumidor.
No voto proferido no julgamento do caso, o relator do recurso, ministro Castro Filho, ressaltou que, para manter a confiança dos consumidores de planos e seguros de saúde e resguardá-los de abusos, a Lei nº 9.656/98 proíbe as empresas seguradoras de rescindir os contratos de maneira unilateral, com exceção dos casos de fraude ou não pagamento da mensalidade por período superior a 60 dias, por ano de contrato. O ministro ressaltou que, mesmo que esse dispositivo legal não existisse, a cláusula do contrato firmado entre a Sul América e a DMNS é "claramente nula porque fere o Código de Defesa do Consumidor, uma vez que traz vantagem exagerada à seguradora em detrimento do segurado, além de ser contrária ao objetivo desse tipo de contrato que é exatamente o de proteger o contratado contra eventuais doenças. O relator cita, em seu voto, doutrina segundo a qual é obrigatória a renovação de contratos dessa natureza após seu vencimento. "Não assiste à operadora a simples recusa em continuar o contrato. Aliás, uma vez celebrado um primeiro contrato, nem mais caberia renovação, ou nem precisaria colocar nele um prazo de duração. Unicamente ao associado ou segurado reconhece-se o direito de continuar na contratação. (...) Um entendimento diferente pode levar as seguradoras a fixar prazos inferiores ao próprio período de carência, com a rescisão mesmo antes de o consumidor iniciar a usufruir de todos os benefícios."
Na decisão que proveu o recurso especial da DNMS, os ministros da Terceira Turma reconheceram a nulidade da cláusula que autorizava a rescisão unilateral. A votação favorável ao recurso foi unânime.
Processo: RESP 602397
Fonte: Luiz Gustavo Rabelo (Superior Tribunal de Justiça)

joi, iunie 16, 2005

Carta dos MNE de Portugal e Espanha aos Ministros do Mercosul

Carta conjunta dos Ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal e Espanha aos seus homólogos do Mercosul

Excelências,
Portugal e Espanha atribuem a maior importância à conclusão de um Acordo de Associação bi-regional ambicioso e equilibrado entre a União Europeia e o Mercosul. Acreditamos que este sentimento é partilhado igualmente pelo outro lado do Atlântico.
Contudo, é inevitável constatar que, após 5 anos de negociações, atravessamos presentemente uma situação de «impasse». Urge ultrapassar esta situação, razão pela qual considerámos útil enviar esta carta aos nossos parceiros do Mercosul.
Este Acordo que pretendemos alcançar é da maior importância em todas as suas componentes, política, económica e de cooperação, e visar não somente a promoção do comércio e do investimento, mas sim colocar definitivamente a nossa relação ao nível que na verdade lhe corresponde.
É certo que os resultados das negociações no âmbito da OMC e a proximidade da reunião Ministerial de Hong Kong da Agenda de Doha deverão ser tidos em conta. No entanto, não podemos encarar o Acordo de Associação apenas numa perspectiva económica, sendo necessário ressaltar a importância da sua dimensão política. Para dar o salto qualitativo, que todos desejamos, no relacionamento entre a União Europeia e o Mercosul, é imprescindível ter em conta o equilíbrio entre as componentes política e económica.
Nesta fase crucial das negociações, entendemos que não devemos perder de vista a perspectiva de longo prazo, sendo agora fundamental actuar com alguma flexibilidade e bastante convicção, de modo a permitir efectivamente reforçar o relacionamento entre as Partes. No momento actual, é mais do nunca necessário dar um impulso político ao processo negocial, sem o qual não será possível prosseguir com as negociações e alcançar um acordo satisfatório para todos os intervenientes
Por todos estes motivos, no seguimento da Reunião de Lisboa, realizada a 20 de Outubro passado, Portugal e Espanha consideram da maior importância dar um impulso político ao processo negocial em curso. Para o efeito, julgamos ser pertinente abordar esta questão numa reunião informal de Alto-Nível, entre os países mais empenhados e a Comissão Europeia, por ocasião da Cimeira das Nações Unidas, no próximo mês de Setembro, em Nova Iorque.

Com os nossos melhores cumprimentos,

Diogo Freitas do Amaral Miguel Angel Moratinos

miercuri, iunie 15, 2005

Educação fora da OMC

O governo brasileiro não vai incluir a educação entre os serviços a serem liberalizados no âmbito do Acordo Geral sobre Comércio de Serviços da Organização Mundial de Comércio (Gats). A informação é do responsável pelas negociações do Brasil junto ao Gats, Ernesto Henrique Fraga Araújo, chefe da Divisão de Serviços, Investimentos e Assuntos Financeiros do Ministério das Relações Exteriores. Ernesto Araújo, que participou nesta terça-feira de audiência pública promovida pela Comissão de Educação e Cultura, garantiu que a propriedade intelectual - outro item polêmico - também estará fora das negociações do acordo.
O Brasil deve apresentar neste mês, em Genebra (Suíça), a lista de serviços que o País pretende negociar no âmbito do Gats.

Pressão. A não-inclusão dos serviços educacionais no Gats foi defendida pelo ministro da Educação, Tarso Genro, por representantes dos reitores e dos estudantes e por deputados que participaram do debate. Os participantes disseram que é grande a pressão de alguns países ricos para que as nações em desenvolvimento abram o mercado educacional, sobretudo o de ensino superior, e se sujeitem às regras da OMC. Para Tarso Genro, a liberação da educação no acordo é incompatível com a soberania educacional do País. "Nós temos que, ao mesmo tempo, ter uma postura firme, soberana, moderna, com fortes relações bilaterais e de interesse nacional, mas não subordinar a educação ao jogo mercantil. É essa a visão que nós temos que desenvolver e consolidar para que o Brasil possa ser forte em todos os setores."O ministro da Educação afirmou que o Brasil deve considerar a educação como "um direito e bem público, e não uma mercadoria, sujeita às leis do mercado. "Não é de nosso interesse transformar a educação em serviço negociado no âmbito do Gats, muito menos como moeda de troca para aumentar o poder de barganha na negociação de acesso a mercados", ressaltou o ministro.
Soberania. Para Genro, se a inclusão da educação no Gats for aprovada, ficam comprometidas a reforma universitária e as políticas públicas de correção dos desequilíbrios regionais no setor. Ele explica que, nesse caso, o Brasil perderia a soberania sobre a regulamentação das instituições de ensino superior e sobre o reconhecimento de diplomas e títulos, por exemplo. A mesma opinião foi defendida por Ernesto Henrique Fraga Araújo. Ele destacou que serviços públicos, como a educação, não podem ser integrados internacionalmente, a exemplo de outros tipos de produtos. "É preciso preservar nosso direito à regulamentação doméstica da educação", salientou.
A deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), que presidiu a audiência, questionou os convidados se a OMC seria o órgão competente para debater questões relativas à educação. O ministro Tarso Genro e o representante do Ministério das Relações Exteriores afirmaram que, por não ser um serviço comercializável, essa questão não deveria ser debatida na OMC.

Internacionalização solidária. Embora defenda a "internacionalização solidária", a reitora da Universidade Federal de Minas Gerais e representante da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Ana Lúcia Almeida Gazzola, sustenta que a cooperação internacional não pode ser transformada em "liberalização predatória". "Não é xenofobia. A educação superior tem que ser política de Estado. Não podemos aceitar interferências exteriores na educação superior, que é uma área estratégica", argumentou. Ana Lúcia Gazzola ressaltou ainda que, se for aprovada a inclusão, poderemos ter no País um modelo de educação sem uma referência social, "que não esteja voltado às identidades culturais brasileiras, à nossa história e às nossas propostas para o futuro".
A vice-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Fabiana Costa, destacou a necessidade de redefinição do papel da educação superior. "Precisamos unir forças para garantir a resistência à liberalização universal da educação superior, que é um fator de desenvolvimento nacional. As universidades têm sua responsabilidade social, pois são um bem público", disse, concordando como ministro da Educação. (fonte: Agência Câmara)

luni, iunie 13, 2005

Conferência sobre "Garantias de coisas móveis e imóveis"

Programa

10.00 – Manuel Januário Gomes, Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, "Garantia das coisas móveis e imóveis: âmbito, limites e noção de conformidade com o contrato";

10.30 – Mário Frota, Professor da Universidade de Paris XII: "Garantias das coisas móveis e imóveis: os remédios legais";

11.00 – Ângela Frota, do Centro de Estudos de Direito do Consumo, de Coimbra: "Garantias das coisas móveis e imóveis: as garantias voluntárias ou comerciais";

11.30 – Cristina Rodrigues de Freitas, do Centro de Estudos de Direito do Consumo, de Coimbra: "A garantia legal dos imóveis de longa duração: as partes integrantes e acessórias";

12.00 – Debate;

12.30 – Almoço livre;

14.30 – Pedro Rodrigues, do Centro de Estudos de Direito do Consumo, de Coimbra: "A indemnização: remédio autónomo ou complementar?";

15.00 – Cons.º Neves Ribeiro, Juiz do Supremo Tribunal de Justiça: "Os mecanismos processuais ao alcance dos consumidores";

15.30 – Debate;

16.00 – Conclusões. Encerramento.

duminică, iunie 12, 2005

Pedido de inconstitucionalidade da nova Lei de Falências (Brasil)

A nova Lei de Falências, sancionada pelo governo no início de fevereiro, já é alvo de uma ação direta de constitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF).
A Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL) ajuizou uma ação no Supremo na sexta-feira, com um pedido de liminar, para contestar, dentre outros pontos, o artigo 83 da Lei nº 11.101/05, conhecida também como Lei de Recuperação Judicial. A Adin terá como relator o ministro Carlos Velloso. O artigo classifica os créditos e a ordem de recebimento dos mesmos. O ponto questionado é o inciso I do dispositivo, segundo o qual os créditos referentes aos trabalhadores terão prioridade. O valor a ser recebido por cada credor, porém, é limitado a 150 salários-mínimos (R$ 39 mil), assim como os créditos decorrentes de acidentes de trabalho. O presidente da confederação, Luís Eduardo Gautério Gallo, afirma que desde o início a entidade foi contra uma limitação aos valores dos créditos trabalhistas. Para ele, isso não deveria ocorrer. A tese da entidade é de que o limite ofende o princípio da igualdade. Isso porque não poderia existir uma diferenciação entre os trabalhadores. "Não é constitucional assegurar a alguns a possibilidade de auferir a integralidade de seus direitos e a outros uma parcela limitada", afirma a confederação na Adin. Gallo afirma que um médico ou advogado, por exemplo, que presta serviço há anos para uma determinada empresa que venha a falir, terá um prejuízo grande porque, com certeza, não receberá todo o valor ao qual teria direito em razão da limitação dos 150 salários-mínimos. Além do inciso I, conforme informações do STF, a entidade questiona o parágrafo 4º do artigo 83, que diz que os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão quirografários - não terão preferência em relação aos demais - na hipótese de cessão de crédito. Para a CNPL, isso afrontaria o direito de propriedade previsto no artigo 5º, inciso XII da Constituição Federal. (Zínia Baeta - Valor Online)

08.03 - Supremo recebe ADI contra a nova lei de falências A Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3424) no Supremo, com pedido de liminar, contra dispositivos da Lei nº 11.101/05, a nova lei de falências. A entidade sindical contesta três artigos da norma: o 83 (inciso I, alínea "c" do inciso VI e parágrafo 4º); o 86 (inciso II); e o artigo 84 (inciso V). O relator da ação é o ministro Carlos Velloso. O artigo 83 estabelece que os créditos derivados da legislação trabalhista têm prioridade na ordem classificatória de atendimento, porém limita-os a 150 salários mínimos por credor. A CNPL contesta esse limite, considerando-o “ofensivo ao princípio da igualdade, haja vista que todos os trabalhadores são trabalhadores, e não é constitucional assegurar a alguns a possibilidade de auferir a integralidade de seus direitos e a outros, uma parcela limitada”. O parágrafo 4º do artigo 83 dispõe que os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão quirografários (não terão preferência em relação aos demais), na hipótese de cessão de crédito. Para a CNPL, isso afrontaria o direito de propriedade (artigo 5º, inciso XII da Constituição Federal), “visto restringir a disponibilidade da coisa”. O inciso III do artigo 86, por sua vez, determina que será feita a restituição em dinheiro da importância entregue ao devedor, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação. “O pedido de restituição é medida portadora de potencialidade esvaziadora dos recursos da massa falida”, observa a CNPL. Por fim, o artigo 84 lista os créditos que serão considerados extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os mencionados no artigo 83 da lei impugnada, colocando, em seu inciso V, as obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, nos termos do artigo 67 da lei, ou após a declaração de falência, e tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência. Para a CNPL, as despesas decorrentes da etapa ou após a decretação da quebra não podem ter o mesmo tratamento das despesas obrigatórias da massa falida - remuneração dos administradores, quantias fornecidas à massa pelos credores, custas processuais, etc. “Dir-se-á que, sem isso, não haverá estímulo à recuperação da empresa, mas esta, por mais estimulável que seja, não pode ter lugar às expensas do sacrifício geral de todos os créditos, em especial os trabalhistas, aqui defendidos”, argumenta a CNPL. A entidade pede, enfim, a suspensão de todos os artigos questionados e, no mérito, a declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos impugnados. (Fonte: STF)

luni, iunie 06, 2005

"Distribuidores acusam cervejeiras de os quererem 'esmagar'"

Em declarações ao PÚBLICO, o presidente da associação, Afonso Barros Queiroz, afirmou que a entidade reguladora presidida por Abel Mateus deu, no ano passado, luz verde a alterações contratuais com os concessionários-distribuidores exclusivos das duas marcas, que 'penalizam, no entanto, a parte mais débil, que são os distribuidores'.
Está sobretudo em causa uma nova cláusula em que reservam para si os 'clientes directos, actuais e futuros' nas áreas que pertencem aos concessionários exclusivos. Para Barros Queiroz, 'pretende-se prosseguir o desvio da clientela dos seus concessionários-distribuidores exclusivos, sem compensação, mantendo os clientes que foram absorvendo no território dos concessionários e lançar mão dos futuros'. O responsável associativo contrapõe, por exemplo, a atribuição de compensações por desvio de clientela, numa área em que as cervejeiras se constituem concorrentes dos seus próprios distribuidores.
A Autoridade da Concorrência entende que as razões da APDCOB fazem parte dos direitos e obrigações das partes, portanto, 'do foro cível' e, assim, fora da alçada do direito da concorrência. Esta posição consta do parecer emitido por ocasião da aceitação dos novos termos contratuais das duas companhias.
Para a associação, tal significa, então, que 'as cláusulas ilegais e a perda dos direitos adquiridos pela parte mais fraca não foram objecto de apreciação e ainda menos de qualquer autorização'. É, aliás, nestes termos que a APDCOB condena o facto de a Central de Cervejas invocar globalmente a decisão da Autoridade da Concorrência, junto dos seus distribuidores, para a assinatura dos respectivos contratos.
A associação tem feito junto da entidade reguladora diversas diligências desde a decisão, por considerar que esta tem 'uma visão formalista da concorrência e que um contrato que esmague os distribuidores é um jogo cumulativo com o risco de o mercado ser cada vez mais fechado, em termos de acesso de outras marcas, exteriores' A interpretação é a de que 'é por esta via que se limita a concorrência', num mercado dominado pelas duas marcas e que lhes rendeu mais de 760 milhões de euros de vendas no ano passado -312 milhões para a Central de Cervejas e 420 milhões de euros para a Unicer.
As alterações aos contratos das cervejeiras, impostas pela AC, já tinham sido, por sua vez, suscitadas por denúncias da associação, que se mostra, todavia, insatisfeita com o resultado.

'Guerra' semelhante na Europa

A Unicer, cujo capital se encontra repartido entre o núcleo duro português (56 por cento) formado pelo grupo Violas, Arsopi e BPI, e pela Carlsberg (44 por cento), declarou que 66 por cento dos seus distribuidores aderiram até agora ao aditamento aos contratos de concessão e garante que os que recusem assiná-lo 'manterão o actual quadro contratual', que a AC considerava, no entanto, lesivo do ponto de vista da concorrência.
Quanto à Central de Cervejas, totalmente detida pela Scottish & Newcastle, desde 2003, referiu que 15 por cento dos distribuidores abrangidos assinaram o novo contrato, estando mais 17 por cento em negociação.
Na parte do mercado que concorre directamente com os seus distribuidores, a Central de Cervejas alega que a sua quota actual é 'idêntica' à de 2000, uma questão para a qual não foi possível obter resposta junto da Unicer. A APDCOB diz que o mercado das duas marcas tem crescido, nomeadamente nas zonas de grande consumo.
As duas cervejeiras foram nos últimos anos objecto de condenações por práticas anticoncorrenciais de abuso de posição dominante, quer por via das entidades reguladoras, quer por via judicial, em relação aos seus distribuidores exclusivos, todos eles PME. A decisão mais significativa foi emanada no ano passado pelo Supremo Tribunal de Justiça, que deu razão a um distribuidor da Unicer, condenando esta ao pagamento de indemnização. Para o pequeno sector da distribuição de bebidas, esta decisão faz jurisprudência.
O movimento que se verifica no país é semelhante ao verificado em outros estados europeus, em que as redes de concessionários distribuidores têm sido reduzidas ou suprimidas, tendo ocorrido o primeiro caso na Dinamarca, com a Carslberg, na década passada.
Para os padrões europeus, Portugal tem um número de concessionários considerado elevado face ao número de pontos de venda. O exemplo francês, que serve de referência para esta área, sugere que o número de concessionários para todas as marcas deveria rondar a centena, embora o país tenha mais do dobro, de acordo com as estimativas da associação, e segundo a qual mais de uma centena é da Unicer e cerca de 70 da Centralcer, sendo o resto de de marcas como a Tagus, Sumol e Cintra." (Público - Economia, 6 de Junho de 2005)

"Estamos a caminhar a passos largos para um assustador desequilíbrio concorrencial"

"Ao fim do primeiro de três anos de mandato, o presidente da CCP faz um balanço positivo da nova gestão que lidera e que sucedeu a 11 anos consecutivos de Governo de Vasco da Gama. Começou por dar prioridade a arrumar a casa e a equilibrar as contas da confederação que, garante, já vinham com quatro anos de défice acumulado. A aposta agora vira-se para a dinamização do comércio tradicional, pedindo que sejam dadas maiores responsabilidades às associações e puxando da manga de um trunfo importante para o futuro próximo: a criação da maior rede de balcões 'online' para o comércio e os serviços em Portugal.

PÚBLICO - Uma das suas bandeiras de campanha foi o reforço da capacidade de intervenção da CCP. Um ano passado, a confederação está mais forte?
José António Silva - Está mais forte porque está mais próxima das associações filiadas. Criámos em finais de Dezembro passado um gabinete de apoio para os associados, algo que a confederação nunca teve e que veio resolver o problema da extrema fragilidade e dificuldade de comunicação que existia entre as associações e a CCP. Estamos também a reunir com as associações - já o fizemos com cinquenta por cento e nos próximos dois a três meses teremos reunido com todas - para conhecer e debater com profundidade e eficácia os problemas inerentes a cada um dos diferentes tipos de associados, regionais, sectoriais e de serviços, e definir estratégias de actuação conjuntas. Antes a comunicação entre a confederação e os associados restringia-se apenas ao apoio a candidaturas às eleições e aos projectos que era a própria CCP a lançar.
P - A confederação ressentiu-se do surgimento da Federação Nacional do Comércio em finais do ano passado?
R - Tanto quanto sei essa federação ainda nem está constituída formalmente. O associativismo é livre em Portugal e estaremos sempre disponíveis para dialogar caso essa federação venha a confirmar-se uma realidade. Mas não me parece nada apropriado haver agora qualquer espécie de fraccionamento ou dispersão num momento em que o sector empresarial e o associativismo perdem cada vez mais capacidade de intervir junto do poder político.
P - Houve perda de associados?
R - Todas as associações continuam a trabalhar no seio da confederação e a beneficiar das estruturas que pomos ao dispor delas, mesmo as que supostamente aderiram aos esforços de constituição dessa nova federação. Aliás, já aderiram mais quatro novas e contamos actualmente com 101 associações filiadas.
P - Durante a sua campanha afirmou também ser muito importante trazer à CCP a filiação dos sectores das finanças, da saúde e das comunicações. Isso já foi conseguido?
R - Esse é um trabalho que vamos deixar um pouco mais para a frente neste mandato. A nossa prioridade foi consolidar a ligação interna da confederação aos associados e não fez sentido até agora dispersar esse trabalho com a abertura de novas frentes.
P - Está satisfeito com a aplicação do novo regime de licenciamento comercial aprovado no ano passado?
R - Nada. Se há 20 ou 30 anos se anteviam os problemas que as grandes superfícies iam trazer, hoje então a questão é premente e exige soluções urgentes. O comércio tradicional veio de uma quota de mercado de 85 por cento para cerca de 15 por cento nos últimos 15 anos e, fruto dos licenciamentos que se estão a fazer hoje, assistiremos muito rapidamente a uma perda de ainda mais 90 por cento. Só na área alimentar desapareceram 20 mil lojas na última década. E temos toda a convicção que o comércio vai perder, nos próximos dois anos, cem mil empregos se nada for feito. Não somos contra a concorrência, somos é por uma concorrência sã de coexistência dos diferentes formatos, o que não está a acontecer apesar de contemplado no novo regime. Há já hoje um enorme desequilíbrio concorrencial para o qual o Estado está a ser incapaz de encontrar respostas.
P - Que papel espera do Estado neste aspecto?
R - Pouco interventor e regulador. Mas não só não intervém como não regula. A lei do licenciamento comercial cometeu o erro gravíssimo de fazer depender a aplicação e execução da lei das comissões que são lideradas pelas câmaras municipais. O Governo desresponsabilizou-se e dispersou a responsabilidade por 365 concelhos, muitos com diâmetros inferiores a três ou quatro ou cinco quilómetros, onde existe uma visão que não é regional - e menos ainda nacional - e onde imperam os interesses imobiliários. As aprovações de licenciamento funcionam muitas vezes apenas como forma de financiamento das autarquias. Não existe qualquer planeamento comercial efectivo e o sistema foi todo pervertido.
P - Mas não foi para isso que a própria CCP criou a figura do gestor do centro comercial urbano?
R - O propósito era esse mesmo, o de formar pessoas com conhecimentos técnicos para trabalharem junto das autarquias que já têm UrbCom [planeamento das cidades num ponto de vista do comércio], mas aquilo a que temos vindo a assistir é que as câmaras não recebem muitas vezes estes gestores da forma como o deviam fazer porque vêm neles uma ameaça aos poderes instituídos.
P - Acha que esses gestores dos centros comerciais urbanos deviam fazer parte das comissões de aprovação dos licenciamentos comerciais?
R - Faria bem mais sentido ter nas comissões alguém com conhecimento técnico daquilo que são o comércio e serviços de uma cidade, do que a figura do presidente da Assembleia Municipal. Aliás, a leitura que faço da presença do presidente da assembleia municipal a par da do presidente da câmara nas comissões de aprovação é a de que se está a dar poder de decisão discriminatório às autarquias nestas matérias.
P - O sector está então sem uma 'carta do comércio' norteadora?
R - E sem quaisquer dados fiáveis para fazer o planeamento e ordenamento comercial urbano. Por isso assinámos há três meses um protocolo com o Instituto Nacional de Estatística para criar estatísticas sobre o comércio e serviços em Portugal, dados esses que não existem - é o próprio INE [Instituto Nacional de Estatística] que o reconhece - e que supostamente devem ser determinantes nas decisões de aprovação dos licenciamentos comerciais. Mas temos até que ir mais além de uma 'carta do comércio'. O Governo tem que ter uma visão estratégica para o comércio e serviços e definir urgentemente um programa integrado para o sector, o qual contribui com 70 por cento do VAB [Valor Acrescentado Bruto, que corresponde à riqueza criada pelas empresas] e com 55 por cento do emprego. A legislação avulsa dos últimos anos apenas tem respondido pontualmente aqui ou acolá às solicitações e, em muitos casos, até em resultado da capacidade de lobi deste ou daquele sector.
P - Refere-se à questão do fecho dos estabelecimentos comerciais ao domingo?
R - Essa é uma das questões essenciais, porque a verdade é que nada justifica que as unidades de grande dimensão estejam abertas ao domingo. Não tem nada de salutar para a economia do país e só serve incentivar de forma desmedida o consumo e para promover um desequilíbrio concorrencial ainda maior entre os diversos formatos comerciais. Aliás, há até um conjunto de grandes "players" da distribuição em Portugal que já defendem em surdina o encerramento dos estabelecimentos ao domingo, porque também eles se sentem ameaçados pelos 'discount'. Estas matérias têm que ser revistas sob o risco de enfrentarmos um problema social bastante grave a curto prazo que não se vai resolver de certeza absoluta com o aumento do IVA.
P - Inevitavelmente o aumento do IVA também irá ter impacto do consumo...
R - Com o actual endividamento das famílias é mesmo impossível que este aumento de dois por cento do IVA não venha a diminuir o consumo. Mas não é só verdade que estamos a consumir acima das nossas capacidades, é também verdade que são necessárias outras medidas para trazer competitividade às empresas, que passam necessariamente pela redução da despesa pública. Aceitamos fazer agora o esforço que evidentemente o país nos exige, mas este aumento dos impostos deve ser provisório e muito bem balizado no tempo, com o compromisso de se avançar com a redução das taxas assim que retomado o equilíbrio. Seria bastante mais justo fazer uma fiscalização sistemática para pôr termo à evasão fiscal do que aumentar a carga fiscal daqueles que já cumprem. Aliás, a concorrência desleal está também a ser promovida por uma série de práticas comerciais sobre as quais carece legislar com urgência.
P - A que práticas se refere?
R - Para começar, ao verdadeiro escândalo de 'dumping' a que temos assistido, em que são utilizadas técnicas de 50 por cento de desconto num conjunto de produtos para contornar a proibição legal de venda abaixo dos preços de custo. Estão a ser feitas coisas, sob a capa das boas práticas, que nada têm a ver com as boas práticas. E também por isso achámos importante fazer um Código de Ética do Comércio e Serviços que apresentaremos publicamente a 29 de Junho e onde a CCP explana aquilo que os empresários devem aceitar como desafio de defesa dos consumidores, do ambiente, de si próprios, de uma boa relação com os fornecedores e todos os parceiros que lhes estão associados e até com o Estado." (Público - Suplemento Economia, 6 de Junho de 2005)

joi, iunie 02, 2005

Livranças - Supremo Tribunal de Justiça (PT)

Processo: 05A1086
N.º Convencional: JSTJ000
Relator: AZEVEDO RAMOS
Descritores: LIVRANÇA / LETRA EM BRANCO / PACTO DE PREENCHIMENTO / RELAÇÕES IMEDIATAS

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

Em 31-1-01, por apenso aos autos de execução ordinária em que é exequente Caixa A, e executados B e mulher, C, vieram estes deduzir os presentes embargos de executado contra a referida A, visando a extinção da execução.

Para tanto, alegaram, resumidamente, o seguinte:
Inexiste título executivo, uma vez que as livranças dadas à execução não são documentos que importem a constituição ou reconhecimento de obrigação pecuniária, por terem sido por eles assinadas e entregues em branco à exequente, que as preencheu em momento posterior, sem que existisse pacto de preenchimento.
Não é determinável o montante da obrigação exequenda em face dos documentos juntos como título executivo, dado ter havido pagamentos parciais.

Mesmo que se considere que existe título executivo, este não se harmoniza com o pedido formulado, porquanto é inferior à soma das importâncias das livranças em execução.
As livranças não são título executivo, visto que se destinam apenas a garantir os empréstimos concedidos pela exequente aos executados.
A dívida dos embargantes à embargada não decorre das livranças dadas à execução, mas de outros títulos.

Por decisão de fls 24 foram rejeitados os embargos da embargante mulher, com fundamento na sua extemporaneidade, e foram recebidos os embargos do embargante marido.

A embargada Caixa A contestou, concluindo pela improcedência dos embargos.

Realizado o julgamento e apurados os factos, foi proferida sentença que julgou os embargos improcedentes.

Apelou o embargante, mas sem êxito, pois a Relação de Coimbra, através do seu Acordão de 9-11-04, negou provimento à apelação e confirmou a sentença recorrida.

Continuando inconformado, o embargante recorreu de revista, alegando abundantemente e em cujas extensas conclusões suscita três questões:

1 - A sentença é nula, por falta de fundamentação, em virtude de não ter indicado, no mínimo, os princípios jurídicos em que se baseou.
2 - As livranças dadas à execução foram preenchidas abusivamente.
3 - As livranças exequendas carecem de força executiva.
4 - Por isso, o Acordão recorrido deve ser revogado e substituído por outro que julgue procedentes os embargos ou, se assim não for entendido, a sentença (e o Acordão) deve ser julgada nula, por falta de fundamentação.

A embargada contra-alegou em defesa do julgado.

Corridos os vistos, cumpre decidir:

A Relação considerou provados os factos seguintes:

1 - A exequente -embargada é possuidora de cinquenta e cinco livranças, sacadas por si e subscritas e assinadas pelo embargante e sua mulher C, todas com vencimento em 1-7-2000, que servem de título à execução, dando-se aqui por integralmente reproduzido o teor das livranças constantes de fls 13 a 67 dos autos de execução.

2 - A embargante, no âmbito do seu principal objecto de exercício de operações A a favor dos seus associados, e por proposta dos executados, ora embargante e sua mulher, concedeu-lhes vários financiamentos, entregando estes à embargada várias livranças para garantia desses financiamentos.

3 - O embargante e sua mulher assinaram e entregaram em branco, à embargada, as livranças referidas no anterior nº1.

4 - As livranças foram preenchidas pela embargada, apondo nelas o valor constante da respectiva proposta de crédito e a data do último acordo, relativo ao vencimento, antes de serem dadas à execução.

5 - As livranças dadas à execução respeitavam a financiamentos após formalização das propostas de crédito, financiamentos que tinham por base letras ou cheques pré-datados, entregues ao embargante por clientes seus, e que este entregava posteriormente à embargada.

6 - A cada uma das livranças referidas no nº1, conforme consta do rosto das mesmas, corresponde uma das propostas de crédito juntas de fls 29 a 83.

7 - As importâncias inscritas em cada uma das livranças correspondem ao montante utilizado nas respectivas propostas de crédito.

8 - As livranças foram preenchidas de acordo com as propostas de crédito e de acordo com aquilo que o embargante contratou com a embargada.

9 - A data do vencimento das livranças foi sucessivamente alterada por pedidos de prorrogação dos planos de pagamento, feitos pelo embargante à embargada e que esta autorizou.

10 - O embargante, alegando imensas dificuldades financeiras, para além do referido no nº9, solicitou ainda que o vencimento fosse todo na mesma data, o que a Direcção da embargada autorizou.

11 - Em 26-4-00, depois de ter tido uma reunião nas instalações da embargada, o embargante solicitou uma prorrogação do débito até 30-6-2000, que foi autorizado, tendo por isso a data do vencimento das livranças o dia 1-7-00, de acordo com o solicitado pelo embargante.

Vejamos, agora, cada uma das questões postas nas conclusões da revista:

1.

Nulidade da sentença, por falta de fundamentação:

A sentença é nula, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão - art. 668, nº1, al. b) do C.P.C.
O recorrente entende que existe nulidade, por a sentença da 1ª instância não indicar as normas jurídicas em que se baseou, nem apontar, no mínimo, os princípios jurídicos em que se apoiou.
Esta questão já foi suscitada perante a Relação, que decidiu no sentido da inexistência da invocada nulidade.
E com razão.
Para que a sentença careça de fundamentação, "não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito (Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora Manual de Processo Civil, 2ª ed., pág. 687).
Relativamente aos fundamentos de direito, dois pontos importa salientar, como acrescentam os mesmos autores (obra e local citados):
"Por um lado, o julgador não tem que analisar todas as razões jurídicas que cada uma das partes invoque em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões suscitadas pelas partes; a fundamentação da sentença contenta-se com a indicação das razões jurídicas que servem de apoio à solução adoptada pelo julgador.
Por outro lado, não é indispensável, conquanto seja de toda a conveniência, que na sentença se especifiquem as disposições legais que fundamentam a decisão: essencial é que se mencionem os princípios, as regras, as normas em que a sentença se apoia ".
Alberto dos Reis ( Código do Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 140) também ensina:

"Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada.
O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade ".

Consequentemente, só ocorre nulidade da sentença, por falta de fundamentação, quando esta é absoluta, como também é entendimento pacífico da jurisprudência.
Ora, na sentença, enumeram-se os factos considerados provados, que suportam a decisão.
Na sua fundamentação jurídica, indicam-se os fundamentos dos embargos de que se impunha conhecer: inexistência de pacto de preenchimento; falta de força executiva das livranças, por se destinarem a garantir empréstimos concedidos pela embargada; proveniência das dívidas de outros títulos que não as livranças.

Todos esses fundamentos foram rejeitados: o primeiro, por se ter provado existir pacto de preenchimento; o segundo, com a argumentação de que o facto das livranças garantirem empréstimos não colide com a força executiva desses títulos de crédito;o terceiro, com a distinção que se deve estabelecer entre a obrigação cartular e a obrigação subjacente ou fundamental e a alusão à característica da abstracção das livranças, ou seja, ao regime cambiário de que a obrigação da livrança é independente da "causa debendi".

Embora não tenham sido expressamente indicados os preceitos legais que sustentam a decisão e a fundamentação jurídica da sentença não seja modelar, o certo é que estão nela indicados, ainda que de forma imprecisa, os princípios e as regras que sustentam a decisão proferida.
Assim, não obstante a fundamentação da sentença da 1ª instância se poder considerar ser incompleta , não se verifica falta absoluta de fundamentação,
De resto, a fundamentação foi melhorada e ampliada no Acordão recorrido.
Improcede, pois, a invocada nulidade.

2.

Preenchimento abusivo das livranças:

Também aqui falece razão ao recorrente.
Preceitua o art. 77 da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças, que são aplicáveis às livranças as disposições relativas às letras em branco ( o art. 10º fala de letra incompleta ).
Por isso, é legalmente admissível a livrança em branco.
A livrança em branco pode definir-se como sendo aquela a que falta algum dos requisitos indicados no art. 75 da Lei Uniforme, mas que incorpora, pelo menos, uma assinatura que tenha sido feita com intenção de contrair uma obrigação cambiária (Abel Pereira Delgado, Lei Uniforme sobre letras e livranças, 7ª ed, págs. 78 e 79).
O preenchimento de uma livrança em branco, condição imprescindível para que possam verificar-se os efeitos normalmente resultantes das livranças, faz-se de harmonia com o chamado contrato de preenchimento.
O contrato de preenchimento é o acto pelo qual as partes ajustam os termos em que deverá definir-se a obrigação cambiária, tais como a fixação do seu montante, as condições relativas ao seu conteúdo, o tempo do vencimento, a sede do pagamento, a estipulação dos juros , etc.
Tal contrato pode ser expresso ou tácito.
Ora, resulta dos factos provados (designadamente, do que consta dos nºs 4, 8, 9, 10 e 11 do elenco desses mesmos factos provados), que houve contrato de preenchimento e que as livranças foram preenchidas em conformidade com o acordado nesse pacto, nomeadamente, quanto à respectiva data do vencimento de 1-7-00, que foi aposta em cada uma delas.
O contrato de preenchimento das livranças e os contratos de empréstimo, cujo pagamento as livranças se destinaram a garantir, são realidades diversas.
A prova do contrato de empréstimo não se confunde com a prova do contrato de preenchimento das livranças.
São contratos distintos, podendo a prova do contrato de preenchimento dos títulos ser feita por qualquer meio, incluindo a testemunhal.
Não pode, pois, o recorrente sindicar a validade do pacto de preenchimento e das respostas aos quesitos a que se reportam os nºs 4, 8, 9, 10 e 11 do elenco dos factos provados.
Face à factualidade apurada, constata-se que entre o embargante e a embargada se estabeleceram dois vínculos obrigacionais: um deles, o do embargante pagar o valor dos empréstimos concedidos pela embargada; e outro, o de pagar as livranças que aceitou, em conformidade com o respectivo acordo de preenchimento.
Cada um desses vínculos obrigacionais tem o seu regime próprio e só, quando pelo cumprimento de um deles, estiver satisfeito o interesse do credor, ficará extinto o outro ( Ac. S.T.J. de 21-1-69, Bol. 183-269).
Não se verificou, pois, o invocado preenchimento abusivo dos títulos.

3.

Força executiva das livranças:

As ajuizadas livranças são título executivo, nos termos do art. 46, al. c) do C.P.C., pelas razões já suficientemente enunciadas no Acordão recorrido, para que se remete, neste domínio, e que seria ocioso aqui repetir.
A circunstância das livranças terem sido subscritas pelo embargante para garantia de financiamentos concedidos pela embargada, não lhes retira força executiva.
Geralmente, quem assina uma letra ou uma livrança e assume a respectiva obrigação cambiária, fá-lo porque já está vinculado por efeito duma relação jurídica anterior.
Esta é a relação jurídica subjacente ou causal, também chamada contrato originário ou relação jurídica fundamental, que pode assumir várias figuras jurídicas, tais como: uma compra e venda, um contrato de mútuo, uma abertura de crédito ou um saldo de conta corrente.
No entanto, tudo se passa como se tal obrigação não existisse, ou seja, como se a obrigação cambiária fosse uma obrigação sem causa.
É que, para as letras e livranças, vigora um regime especial, que reflecte a preocupação de defender os interesses dos terceiros de boa fé, imposta pela necessidade de facilitar a circulação dos títulos de crédito (Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, Letra de Câmbio, vol. III, págs. 38 e segs, Abel Pereira Delgado, Obra citada, pág. 107).

Esta especialidade pode sintetizar-se nos seguinte princípios:
a) - incorporação da obrigação no título ( a obrigação e o título constituem uma unidade) ;
b) - literalidade da obrigação (a reconstituição da obrigação faz-se pela simples inspecção do título) ;
c) - abstracção da obrigação (a letra é independente da "causa debendi";
d) - Independência recíproca da vária obrigações incorporadas no título (a nulidade de uma das obrigações que a lei incorpora não se comunica às demais);
e) - autonomia do direito do portador (o portador é considerado credor originário).

Aqui e agora, importa sobremaneira frisar que a obrigação cambiária é uma obrigação abstracta e, portanto, independente de qualquer "causa debendi", válida por si e pelas estipulações expressas nas livranças, ficando o embargante vinculado ao pagamento dos seus respectivos montantes porque aceitou esses títulos, em conformidade com o pacto de preenchimento, apondo neles a sua assinatura.
Encontrando-se as livranças no domínio das relações imediatas, a exequente-embargada pode invocar, perante o executado-embargante, o acordo de preenchimento que fixou a dada do vencimento de todas as livranças em 1-7- 2000.
Termos em que negam a revista.
Custas pelo recorrente.
Lisboa, 3 de Maio de 2005
Azevedo Ramos
Silva Salazar
Ponce Leão